Lembro-me muito bem do dia de nosso primeiro beijo lá no baile da universidade de Lisboa. A forma certa e nítida do seu nariz, a luz úmida exprimindo vermelho nos seus beiços fiéis. As suas pálpebras batendo, um convite inabalável neste dia caloroso de verão. Tínhamos falado do seu namorado francês, ou talvez italiano, com o bigode que sempre te fazia cócegas na linha reta no alto dos seus lábios, neste momento os mesmos lábios abrindo para me falar, me contar, me beijar. O ar borrava, você vestiu um casaco, chegava um vento frio do norte, uma sombra ou um esforço vão do seu italiano de nos separar. Não, então não foi ele. Recordo agora, deveria ter sido francês, o vento veio do norte, claro, e o italiano seu amigo ao lado já beijando uma russa menos tímida que você. Ou, lembro-me melhor, fui eu o tímido, te pedi permissão para te beijar, para te contar meus pecados, nessa noite distante do verão. Você me acercava, com corpo e alma juntos, falando, sussurrando, cantando o frio daquela noite nas escadas na universidade de Lisboa. O ar frígido voltava, esta vez mais marcado, mais resolvido de nos apartar no ponto da minha confissão. Nunca esqueci do aspecto dos seus olhos neste instante quando me pediu de ser sempre honesto com você, nessa noite e para frente, como se fosse uma opção, uma preferência para eu escolher. Eu te admiti a minha amor, a vida que trairia, e até o final, antecipando os dias que floresceam daí, e depois a morte inadiável da distância. Embora o frio me perseguisse, eu te confessei tudo nesta noite frígida descendo nas escadas da universidade de Lisboa.

Sim, nunca esquecerei a noite do nosso último beijo, lá num país distante, naquela noite fria e assombrada de inverno, o último momento de memória que ainda não sumiu do meu coração.